Chegamos à pequena cidade num dia de quase-inverno. Quase dia, quase noite. As chuvas trouxeram frio, as águas trouxeram lama, o inverno chegando trouxe dias cinzentos.
Nossa missão é adentrar às matas e os sertões à busca dos antigos quilombos espalhados pelas serras que cercam a região. Estamos em um imenso vale. Horas de estrada e dias de caminhada à pé, cavalo, burro ou barco, seguindo pelas picadas abertas entre feridas de negros fugidos da escravidão e dos maus-tratos.
Chegamos à diminuta Iporanga, portal para as cavernas do Vale do Ribeira. E encontramos a cidade, com suas poucas luzes, parecendo sem vida. A noite caíra. O frio viera. As pessoas estavam escondidas.
Entre penumbras e luzes, vimos mais que imaginamos.
A cidade sem gente, as ruas sem carros, a noite sem ruídos, a igreja em reforma, sem um pároco para atender os cada vez mais poucos fieis.
Na praça da matriz, já um pouco escura, o som de longe se faz notar. E foi este som que fui seguir. A surpresa, foi encontrarmos a passagem da Bandeira do Divino Espírito Santo, indo de casa em casa, levada pelos mais crentes, mais persistentes. A pequena procissão segue as ruas indo de casa em casa pedindo prendas, doações, e orando e cantando pedindo as bênçãos para o lar, entre rezas e ladainhas.
O escuro e frio da noite, a gente pouca, os fotógrafos rodeando, não impediram a fé do povo em desejar aos demais, a todos, melhores dias nessa vida tão sofrida. Os quilombos, vamos visitar amanhã. Hoje vemos mais estes, que nasceram livres, mas que são descendentes de quilombos, muitos deles. E vamos atrás dos filhos quilombolas, que fugiram da escravidão para lugares tão distantes, e hoje, passado tanto tempo, ainda estão presos e condenados pelos crimes de seus captores.
Acompanhe aqui com a gente. Ainda vamos longe na selva e nas matas, ora seguindo trilhas, ora abrindo picadas. Vamos fotografar os quilombos e ouvir suas histórias.